terça-feira, 27 de novembro de 2007

Esculturas (quase) vivas

Aproveitando o tema da aula de hoje, as criações de um cara que mistura arte e robótica.
:)

Mistura de artista e engenheiro, o holandês Theo Jansen cria estranhos animais de plástico que caminham impulsionados pela força do vento.

Theo Hansen/Art Futura
As Strandbeest (Bestas da Praia): movimentos complexos com recursos econômicos

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Como é praxe entre os artistas contemporâneos, o holandês Theo Jansen gosta de se definir em termos um tanto pedantes. "Sou um escultor cinético", diz. E complementa: "Sou um artista que esculpe o ar a nossa volta". A arte cinética – que incorpora o movimento – tem já uma certa tradição entre as vanguardas do século XX, principalmente a partir dos móbiles desenhados pelo americano Alexander Calder. Jansen levou-a alguns passos adiante. As partes de um móbile limitam-se a girar e balançar com a força do vento. As obras de Jansen andam. Como insetos gigantescos, elas se movem pelas praias holandesas onde o artista as instala. Compostas de material leve e barato – tubos plásticos, fios de náilon, fita adesiva –, essas criaturas impressionam pela complexidade dos movimentos. Impulsionadas ao acaso, pelo vento, dão a impressão de ser vivas. Jansen, aliás, tem pretensões demiúrgicas: quer produzir criaturas realmente "vivas", reunidas em "manadas" cujos integrantes competem entre si para se reproduzir. "Eu busco refazer a natureza com a idéia de que, no processo, possa revelar alguns segredos da vida", diz.

Theo Hansen/Art Futura
Animaris Rhinoceros: monstro de 2 toneladas que carrega passageiros

É improvável que essas criaturas de plástico um dia realizem todas as pretensões de seu criador. Elas ainda são incapazes de funções bem mais elementares do que a reprodução – não sabem evitar obstáculos, por exemplo. Mas é admirável o que Jansen conseguiu com recursos tão econômicos. Sem nenhum combustível, sem propulsão elétrica, sem programas eletrônicos, seus esqueletos plásticos caminham apenas com a força do vento. Os modelos mais refinados começam a explorar modos de preservar a energia eólica, comprimindo ar em garrafas plásticas – o que permitirá que andem alguns passos mesmo em dias sem vento. A obra de Jansen é um estimulante cruzamento de arte e engenharia. Ele costuma expor suas esculturas tanto em mostras de arte quanto em salões de robótica e convenções de inventores. O artista estudou ciências na Universidade de Delft e dedicou sete anos à pintura antes de enveredar pela robótica. Criou um robô que desenhava grafites e uma espécie de disco voador – que voava mesmo e causou certo pandemônio nas ruas de Delft, em 1980. Há cerca de vinte anos, começou a desenhar criaturas no computador, em seu laboratório na cidade de Ypenburg. Criou uma série de animais virtuais, que depois disputavam corridas no computador. Jansen descartava os modelos lentos e tentava aprimorar os mais velozes. Era a sua forma de instaurar uma espécie de "seleção natural" que garantisse a evolução de seus estranhos bichos.

Foi com base nesses modelos computacionais que Jansen começou a criar suas esculturas cinéticas. Já conta hoje com vários modelos de animais, em uma série que batizou de Strandbeest (Bestas da Praia). Uma invenção mais recente é o Animaris Rhinoceros, que, apesar de ter 2 toneladas, também anda com a força do vento – e pode igualmente ser puxado por uma pessoa, sem grande esforço. É possível instalar passageiros sentados dentro do monstrengo, que funciona, portanto, como um meio de transporte. Jansen sonha com o Animaris Mammoth, uma versão de 12 toneladas que abrigaria várias salas em seu interior.

William West/AFP
Modelo de helicóptero feito a partir de desenho de Da Vinci : a arte de projetar o que ainda não é realizável

As visões mais extremadas de Jansen talvez nunca se realizem. Mas suas maluquices nem por isso são menos estimulantes. Num momento em que a "vanguarda" se tornou convencional – como atestam as instalações feitas de paçoca e as performances de viúvas de astros pop –, Jansen tenta reavivar a figura renascentista do artista-inventor. O nome paradigmático dessa estirpe foi Leonardo da Vinci, cujos desenhos geniais anteciparam o helicóptero, o submarino, a bicicleta. É verdade que o papel de Da Vinci como inventor tem sido um tanto romantizado: não, ele não colocou nenhuma dessas engenhocas futuristas para funcionar. Mas seus desenhos fixaram concepções, projetos para o futuro. Quem pode dizer que, no futuro, algum meio de transporte não será inspirado nos bichos de Theo Jansen?


fonte: http://veja.abril.com.br/281107/p_162.shtml

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